terça-feira, 15 de junho de 2010

A CRISE DE 1929 E A REVOLUÇÃO DE 1930 EM ALÉM PARAÍBA

Por Mauro Luiz Senra Fernandes

A característica mais importante da crise de 1929 foi o seu caráter mundial. Iniciada nos Estados Unidos, em pouco tempo atingiu, praticamente, todo o mundo. Havia um grande número de países que mantinham transações comerciais com os Estados Unidos; essa dependência era mais acentuada nos países que recebiam empréstimos norte-americanos.

Os que mais sofreram foram os que tinham recebido capitais norte-americanos sob forma de empréstimos ou investimentos, já que de uma hora para outra eles foram retirados.

Nas décadas de 1920 a 1930, o café representava cerca de 70% da totalidade das exportações brasileiras, e os Estados Unidos eram os maiores compradores e consumidores do produto. A redução das importações por parte dos Estados Unidos, devido a crise de 1929, significou uma queda total das exportações do café brasileiro. O Brasil dependia principalmente das vendas de café no exterior para equilibrar a balança comercial.

Um fator interno veio agravar a crise no Brasil: durante muitos anos, os estoques de café vinham aumentando nos armazéns, já que no ano de 1906, quando houve superprodução, adotou-se a política de armazenar os excedentes para vendê-los nos anos em que a colheita não fosse tão favorável. O armazenamento foi feito com financiamentos de bancos estrangeiros, com garantia do governo brasileiro.
A crise de 1929 trouxe, além da diminuição do consumo, o abandono da política de estocagem, pois os bancos estrangeiros não mais estavam em condições de financiá-las, e o preço do café começou a cair. O valor do café exportado pelo Brasil passou a ser de somente 53% do total das nossas exportações.

Mas a crise de 1929 não afetou somente o café; os preços de todos os produtos primários foram afetados da mesma forma, reduzindo a receita das rendas da exportação e aprofundando a crise.

Mas a indústria, em geral, foi favorecida pela crise. Muitos capitais investidos na produção do café passaram a ser aplicados em empresas industriais. A crise econômica provocou a desvalorização da moeda brasileira, reduzindo sensivelmente seu poder de compra e tornando mais caros os produtos importados do estrangeiro. Isso estimulou a fabricação de produtos similares no país.

No Brasil, os setores mais afetados foram os que estavam ligados à exportação. Mesmo assim, muitos fazendeiros sofreram grandes perdas. Passaram a exigir do governo medidas para solucionar a crise, mas o governo mostrava-se incapaz de resolver o problema, perdendo com isso o apoio dos setores descontentes.
Até essa época, o principal apoio dos governos tinha sido a classe dos grandes fazendeiros e os proprietários. A busca de posição de classe abria o caminho para soluções radicais violentas. Alguns dos grupos opostos ao governo se uniram para derrubá-lo; Washington Luís, Presidente da República, em 1930, foi afastado e, no seu lugar, assumiu o poder, com apoio da Forças Armadas, Getúlio Vargas.

O motivo imediato da disposição de Washington Luís, na chamada Revolução de 1930, foi sua incapacidade de resolver os problemas criados pela crise de 1929. O governo de Getúlio Vargas resolveu a crise obtendo créditos para comprar uma vez mais os excedentes. Mas dessa vez, esses excedentes não foram armazenados. Uma pequena parte foi trocada por trigo americano, o resto foi queimado para manter o preço no mercado.

A Revolução de 1930

Foi um movimento político-militar que derrubou o Presidente Washington Luís em outubro de 1930 e acabou com a “Primeira República”, chamada pelos livros didáticos do ensino médio de “República Velha”, levando Getúlio Vargas ao poder.

A Crise da “Primeira República” – oligárquica – agrava-se na década de 1920 e ganha visibilidade e amplitude com a mobilização operária – greves (a classe operária era formada por brancos e imigrantes europeus com influência do socialismo e do anarquismo – havia racismo contra negros e nordestinos), as revoltas tenentistas (movimento das camadas médias do exército, descontentes com má política do coronelismo, contra o “voto-cabresto”, defendia o voto secreto e a modernização do Estado) e as dissidências políticas (em 1922 é fundado o PCB) que enfraqueceram as oligarquias, ameaçando a aliança entre São Paulo e Minas Gerais.

Em 1929, o Brasil começa a ser afetado pela crise da quebra da Bolsa de Nova Iorque que compromete o comércio mundial. Alegando defender os interesses da cafeicultura, o Presidente paulista Washington Luís, lança como candidato à sucessão o governador de São Paulo, Júlio Prestes, do PRP (Partido Republicano Paulista). Ao indicar outro paulista, rompe a política do “café-com-leite”, pela quais mineiros e paulistas se alternavam no poder. Em represália, o Partido Republicano Mineiro (PRM) passa à oposição, forma a Aliança Liberal e apóia o gaúcho Getúlio Vargas para a Presidência tendo o paraibano, João Pessoa como vice.
O programa da Aliança Liberal contém reivindicações das forças democráticas de todo o País, como a defesa do voto secreto e da Justiça Eleitoral. Mas, em março de 1930, seus candidatos perdem a eleição para a chapa oficial, formada por Júlio Prestes e pelo baiano, Vital Soares. A oposição começa a desmobilizar-se quando João Pessoa é assassinado, em crime passional. Os aliancistas atribuem motivos políticos ao crime e deflagram uma rebelião política-militar.

Chefiada por líderes aliancistas e tenentistas, a revolta é articulada entre o Sul e o Nordeste, e tem o apoio de diversos estados. Começa no Rio Grande do Sul, em 3 de outubro, liderada por Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha e Góis Monteiro. Em seguida, irrompe no Norte e no Nordeste, sob o comando do tenentista Juarez Távora. Sem encontrar resistência, os revoltosos avançam sobre o Rio de Janeiro. Os ministros militares antecipam-se ao movimento e depõem Washington Luís em 24 de outubro.

No dia 3 de novembro, Vargas chega ao Rio de Janeiro e assume o Governo Provisório. Nomeia interventores nos estados, mas tem problemas para acomodar os interesses das forças que sustentam seu governo. Isso retarda as medidas político-institucionais, como a convocação da Assembléia Constituinte, provocando denúncias e manifestações públicas, algumas das quais se tornam revoltas, como a Revolução Constitucionalista de 1932.

A nova Constituição só é aprovada em 1934, após forte pressão social. Mas a estrutura do Estado brasileiro modifica-se profundamente depois da revolução de 1930, tornando-se mais ajustada às necessidades econômicas e sociais do País. O regime centralizador da “Era Vargas” estimula a expansão das atividades econômicas urbanas e o deslocamento do eixo produtivo da agricultura para a indústria, estabelecendo as bases da moderna economia brasileira.

A Revolução de 1930 em Além Paraíba

Sargento Batista

O Comando revolucionário defronte a Estação Ferroviária de Porto Novo

Além Paraíba foi um lugar estratégico na “Revolução de 30”, com o deslocamento de soldados vindos de todas as partes. Reservistas foram convocados para enfrentar as tropas legalistas, já entrincheiradas do lado de lá do caudaloso rio Paraíba do Sul, que separa Minas Gerais do estado do Rio de Janeiro, esperando apenas a ordem do comandante para atravessarem o rio e tomarem de assalto a cidade, reduto dos soldados revolucionários comandados pelo coronel Americano Freire, Major Lerac e outros. A cidade tornou-se uma praça de guerra, estabelecendo-se a interdição da ponte interestadual sobre o rio Paraíba do Sul, de trezentos metros de extensão e cinqüenta de altura, com assentamento de minas e sacos de areia. A qualquer momento, tudo poderia ir pelos ares, com estrondo das minas e das bombas sincronizadas em toda a ponte.


Foi uma época de muita tensão na cidade, notícias pelo rádio que punham a população sobressaltada, inclusive pela possibilidade de invasão – muitas famílias se refugiaram na zona rural, deixando a cidade quase vazia.


O soldados transitavam por toda parte, em movimento febril. Tropas militares de um lado e do outro do rio já tomavam posições estratégicas, esperando a qualquer momento a ordem de combate. A primeira vítima fatal dos tiros, vindos do outro lado do rio, foi um operário de obras na cidade – João de Castro – que retirava areia à margem do Paraíba, atrás da Estação Ferroviária de São José. Diz-se que o autor do disparo o fez por puro divertimento pois João de Castro não era soldado, nem se encontrava em ação de guerra – “Quer ver como se mata um homem?” – teria dito a alguém que se encontrava a seu lado. Pelo óculo de alcance da metralhadora fez pontaria e o tiro foi certeiro.

Nessa altura, estavam do lado de Minas, soldados entrincheirados a sete quilômetros, em gôndolas de aço da ferrovia, respondendo ao cerrado tiroteio das tropas adversárias, acampadas no outro lado do rio, quando uma bala inimiga bateu na borda da gôndola, ricocheteou e veio atingir mortalmente o reservista alemparaibano Oswaldo Francisco Lopes Tomazini, no dia 16 de outubro.

A situação estava cada vez mais tensa, pois a oficina ferroviária era alvo das tropas adversárias que aguardava o recebimento de um canhão como reforço a qualquer momento. Os trens expressos e mistos diários que transitavam à margem do rio Paraíba do Sul, vinham em grande velocidade pois eram atingidos pelas balas partidas das tropas acampadas do outro lado.

Nas Oficinas da Leopoldina, foi construído um canhão que foi entregue ao alto Comando que, imediatamente, o enviou ao local onde as forças antagônicas trocavam tiros. O primeiro tiro disparado pelo canhão acertou em cheio o edifício da Estação Ferroviária de Paquequer, que desmoronou-se, pondo os soldados em fuga. Houve, assim, a batalha decisiva que culminou com a vitória do lado de Além Paraíba. Não se sabe quantos tombaram nessa batalha, nem seus nomes, pois as fontes militares são muito discretas.
Com o fim da revolução, a cidade sofreu um duro golpe, com a perda de muitas vidas. Estava vitoriosa a revolução em todo o território nacional.

Ponte no Rio Paraíba do Sul próximo a Estação Ferroviária de Paquequer

No dia 3 de dezembro de 1930 houve, entretanto, um pavoroso desastre no local que mais tarde passaria a chamar-se Praça Getúlio Vargas, onde funcionava o comando das forças revolucionárias, sediado em Porto Novo, centro comercial da cidade. O paiol de munições, repleto de dinamites explodiu com tal intensidade que levou para os ares o próprio prédio do comando, de dois andares, inclusive dois prédios laterais, também de dois andares, provocando a morte imediata de, aproximadamente, trinta pessoas, vinte seis feridos – alguns falecidos em conseqüência do acidente. O Comando estava, exatamente por ter terminado a revolução, acertando as contas com todos aqueles que colaboraram com o movimento revolucionário, quer emprestando armas, animais ou fornecendo cereais e outros implementos requisitados pelo Comando e colocando as munições nos vagões para serem enviados para a cidade de Juiz de Fora. Conforme fonte oral, diz-se que, nesse dia, fazia-se um calor imenso na cidade, quando o Sargento Batista chamou a atenção do major Lerac, dizendo que a temperatura podia prejudicar o trabalho e colocava em risco a segurança do paiol de munições. O Major Lerac não aceitou o questionamento e mostrou para o sargento que ele era a maior autoridade do Comando. Além da explosão que matou populares no local, o cabo do bonde elétrico, de alta tensão, arrebentou-se, chicoteando no solo com descargas, ceifando ainda muitas vidas. Longe se escutou a explosão e viu-se o grande cogumelo de fumaça subindo pelos ares. O terror e o pânico apoderou-se da população: havia corpos estraçalhados por toda parte.

Cessado o pânico, foi feito o balanço das conseqüências e apurado o quadro de mortos e feridos. Entre os inúmeros mortos estavam: Major Lerac e sua esposa, o Tenente Mário Stewart, Antônio Moreira Júnior, Ludgero Moreira, o fazendeiro Álvaro dos Reis Villela e seu filho Milton, José Kalim Salomão, sua esposa, sogra e as filhas-meninas Ivone e Eny, Filadelfo Couto, o industrial Affonso Salvio, Acácio Lopes, José Martins Fortes, Alfredo Santero, os soldados Serapião Santos, João Laureano, Júlio Soares, Sargentos Marinho e Angenor Anspeçada Virgílio e o Tenente José Barroso. E, ainda, o menino Imanoel Batista, filho do combatente Sargento Batista, as meninas Iêda e Alda, filhas de Anibal Perácio. Mas, jamais se pôde precisar a quantidade exata, inclusive admitindo-se que inúmeros corpos despedaçados teriam sidos despejados no rio Paraíba do Sul pela explosão e nunca mais encontrados.

Jornal "Além Parahyba" - 29 de novembro e 3 de dezembro de 1931

Missa realizada na Igreja Matriz de São José em memória dos alemparaibanos mortos na Revolução de 1930.

Jornal "Além Parahyba" - 4 de outubro de 1931
Final da Revolução de 1930 - Chegada a Nova Friburgo, da composição ferroviária, trazendo, do município fluminese do Carmo as "forças legalistas" (derrotadas) do "Batalhão Galdino do Valle", que haviam ído ao município mineiro de Além Paraíba, para combater as forças rebeldes (vitoriosas), vindas daquele Estado.
Fonte: adaptação dos textos de Joaquim Moreira Júnior, Octacílio Coutinho e Dona Natanael Batista.

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